Georges-Louis Leclerc, conde de Buffon 1707-1788 |
Foi precursor de Jean-Baptiste de Lamarck e Charles Darwin. com suas concepções filosóficas e o estudo das espécies, que foram ótimos subsídios para o progresso da biologia. É considerado um dos maiores biólogos do seu tempo, Buffon, segundo Darwin, foi um dos primeiros a estudar cientificamente a origem das espécies.
Tornou-se o encarregado do Jardin du Roi (depois Jardin des Plantes), em Paris a partir de 1739 reunindo espécimes zoológicos e botânicos. Durante seu período no cargo, ele converteu o jardim real em museu e em centro de pesquisa, e o parque foi consideravelmente ampliado, com a adição de muitas árvores e plantas de todo o mundo.
Wikipédia
Em 1789, Buffon descreveu como Le Touan o mesmo fenótipo da espécie Monodelphis brevicaudata Erxleben, 1777, já descrito minuciosamente por Pallas (1784: 235) como Didelphis brachyvra e citado na postagem anterior. Ver o LINK. No entanto ele tratou Le Touan como uma doninha (belette), e por isso essa variação geográfica de M. brevicaudata foi descrita mais tarde como Mustela touan por Bechstein (1800: 358) e como Viverra touan por Shaw (1800: 432).
Na verdade Buffon não descreveu Le Touan em 1789, uma vez que já estava morto. Essa é a data de publicação da descrição de Le Touan, que está em sua História Natural (Histoire Naturelle) em 44 volumes, publicada entre 1749 e 1789, portanto uma publicação parcialmente póstuma. A descrição de Le Touan está na página 252 na Histoire naturelle générale et particuliére, servant de suite à l’histoire des animaux quadrupèdes. In Histoire naturelle, avec la description du cabinet du Roi, ed. G. L. L. de Buffon. Paris: L’Imprimerie Royale, Supplément, 7:1–8, ix–xx,+364 pp., 81 pls. Veja abaixo o Frontispício do volume, a descrição original e a ilustração de Jacques de Sève, PL.61, p.252, citada na descrição.
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Em 1800, o Touan de Buffon foi descrito por Bechstein (p.359). como uma doninha: Mustela touan, baseado em Buffon (1789: 252).
233. Das Tuan-Wiesel. (Tuan W.) p)
Le Touan de la Cepedes etc. Buffon Suppl. VI. (VII) 252 Tab. 61.
Der Obertheil des kopfs und Leibes ist schwärzlich; die Seiten des Leibes, Kopfs und der Beine glänzend rostfarben; der Untertheil des Halses und Leibes rein weiss; die Länge von der Nase bis zum Schwanze mehr als fünf Zoll; der Schwanz etwas mehr als zwen Zoll lang und nach dem Ende zugespizt.
Bewohnt Cayenne, lebt in hohlen Bäumen, nährt sich von Würmern und Insecten und bringt zwen Junge aus einmal zur Welt, melch es mit sich aus dem Rüken megträgt.
p) Mustela Touan. B.
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233. A doninha Tuan. (d. Tuan) p)
Le Touan de la Cepedes etc. Buffon Supl. VI. (VII) 252 Tab. 61.
A parte superior da cabeça e do corpo é enegrecida; os lados do corpo, cabeça e pernas cor de ferrugem brilhante; a parte inferior do pescoço e do corpo são de um branco puro. O comprimento do nariz até a cauda mais de cinco polegadas; a cauda com pouco mais de dois centímetros de comprimento e com ponta fina.
Habita Caiena, vive em árvores ocas, se alimenta de vermes e insetos e dá à luz duas crias de tempos em tempos, ordenhando-as nas costas.
p) Mustela Touan. B.
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George Shaw, 1800. General Zoology, p.432, também baseado em Buffon (1789: 252), descreveu Viverra touan.
TOUAN.
Viverra Touan. V. ferruginea, subtus alba, cauda versus apicem nuda.
Ferruginous W. white beneath, with the tail naked towards the tip.
Le Touan. Buff. suppl.7. p.252. pl.61.
Esta espécie muito pequena, menor que a doninha comum, que é nativa de Caiena, vive em buracos de árvores, e se alimenta de vermes e insetos. A parte superior do focinho, a cabeça, e todo o corpo até a cauda, é enegrecida; os lados do corpo e membros são de um ferrugem vivo; e as partes inferiores, da garganta à cauda, branco: a cauda é nua em direção à ponta.
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Talvez pela sua vistosa pelagem, le Touan de Buffon foi mais frequentemente figurada que as demais espécies do gênero. Além da gravura em branco e preto, de J. de Sève (usada na descrição original), outras figuras coloridas aparecem nas diversas edições das obras de Buffon.
Dois pontos da descrição do Touan de Buffon chamaram minha atenção: "mas se assemelha (à doninha) no formato da cabeça e do corpo alongado sobre pernas pequenas," e "O touan tem cinco dedos armados de unhas em cada pé". Certamente essas afirmações não correspondem as características dessa espécie, e provavelmente exista uma justificativa para isso. Se levarmos em consideração as 4 primeiras ilustrações, podemos notar uma mudança na forma de se representar a cabeça desse animal. Nas três primeiras, o focinho do animal é curto, realmente lembrando o focinho de uma doninha, mas na quarta o Touan é apresentado com um focinho pontudo, como nos didelfídeos. Acredito que Buffon, quando realizou a descrição, tenha se baseado num animal empalhado (o que explicaria a sua pequena plataforma basal), ou até numa pele sem o crânio ou o esqueleto. Isso certamente fez com que ele considerasse o animal como uma doninha.
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Podemos dividir a história taxonômica do gênero Monodelphis em 2 fases distintas.
Na FASE 1, que vai de 1648 até 1800, o conceito de Monodelphis ainda não existia, e nem o conceito de Didelphis ou de Marsupial tinham o significado que têm hoje. Nessa fase todos os marsupiais eram Didelphis, até cangurus e inclusive um primata, Didelphis macrotarsus (hoje Tarsius tarsier).
Em 1735, na 1ª edição do Systema Naturae, Lineu colocou Didelphis na Ordo Ferae, juntamente com alguns dos atuais Carnivora, "insetívoros" e o morcego Vespertilio. Posteriormente, na 6ª edição, na Ordo Glires, juntamente com roedores e "insetívoros", e em 1758, na 10ª edição, a mais importante, Didelphis foi colocado na Ordo Bestiae, que incluía "insetívoros", os tatus: Dasypus e os porcos.
Entre 1788 e 1793, Johann Friedrich Gmelin publicou uma versão aprimorada do Systema Naturae de Lineu, que é considerada como a 13ª edição do Systema. Nessa edição Didelphis foi recolocado na Ordo Ferae.
Mathurin Jacques Brisson, em 1756, foi o primeiro a separar os marsupiais dos ratos e "insetívoros" descritos por Albertus Seba, no seu Thesaurus. Ele criou a ORDO XVIII com um único gênero: Philander, que era composto por 9 espécies. Sendo o primeiro a separar o Philander cauda brevi, dos demais congêneres, o qual seria mais tarde, nominado por Erxleben como Didelphis brevicaudata, em 1777. Só em 1788, Gmelin inseriu Didelphis brachyura (de Schreber) como a espécie 8, de Didelphis, no Systema Naturae, citando Brisson.
Em 1758, na DÉCIMA EDIÇÃO, Linnaeus reconheceu apenas 5 espécies no seu gênero Didelphis: 1. D. marsupialis, 2. D. philander, 3. D. opossum, 4. D. murina e 5. D. dorsigera. A partir dessas 5, o gênero Didelphis de Linnaeus, passou a aglutinar todos os marsupiais conhecidos, até os cangurus. Em 1792, no Animal Kingdon de Robert Kerr, uma versão do Systema Naturae de Gmelin, o gênero contava com 19 espécies, e continuava incluído na Ordo Ferae.
Em 1803, Geoffroy Saint-Hilaire coloca o gênero Didelphis (de Linnaeus) numa ordem separada, PÉDIMANES, que incluía outros gêneros de marsupiais, antes colocados dentro de Didelphis. Genre XL Dasyurus, e Genre XLI Phalangista. Mas os cangurus foram colocados junto com os roedores na Ordem VI RONGEURS. Nessa mesma publicação, na página 144, Geoffroy criou Didelphis tricolor, um novo nome para D. brachyura de Pallas, que ele considerou como uma espécie diferente de D. brachyura de Schreber. Ele também reconheceu o TOUAN de Buffon como um sinônimo de Didelphis tricolor, transferindo a espécie de Buffon do gênero das doninhas, para o gênero Didelphis.
Em 1811, Illiger cria o táxon Marsupialia, como uma familia da Ordo Pollicata, que incluía os Primatas. Essa familia era constituida pelos gêneros Didelphis, Chironectes, Thylacis, Dasyurus, Amblotis, Balantia, Phalangista e Phascolomys. Mas, assim como Geoffroy, manteve os cangurus num grupo separado: na Ordo Salientia.
Em 1815, assim como Geoffroy (1803:144), Illiger associou o "Tuan" (de Buffon), com Didelphis brachyura (de Pallas), e afirmou que : "a brasileira [Didelphis] Tristriata é uma espécie interessante, porque foi colocada com os musaranhos sob o nome Sorex Brasiliensis (de Erxleben, =americanus de Müller), após um comunicado inadequado do normalmente estimado Marcgrave. Mas tem todas as características de um verdadeiro marsupial". Esse "reconhecimento" foi, sem dúvida, uma postura decisiva na História Taxonômica do gênero Monodelphis.
Finalmente, só em outubro de 1816, no prefácio de O Reino Animal, George Cuvier coloca "todos" os marsupiais dentro da ORDRE Marsupiaux. Desta vez incluindo também os cangurus. Mas não aceitou Didelphis tricolor de Geoffroy, tratando Le Touan como (Did. brachyura), v. a fig. abaixo. Também não mencionou Didelphis tristriata de Illiger, nem sequer entre os musaranhos como: Sorex brasiliensis.
Os animais que hoje são colocados no gênero Monodelphis, foram inicialmente chamados de ratos, popularmente ainda são tratados assim, a espécie Monodelphis domestica é chamada de rata catita ou de rato-cachorro. O termo MUS ou MURIS era aplicado aos pequemos mamíferos, indiscriminadamente. A espécie de Monodelphis hoje conhecida como Monodelphis americana, permaneceu durante 167 anos como "O Musaranho do Brasil" e a atual Monodelphis brevicaudata, foi rato, musaranho, doninha e viverrídeo, além de Didelphis. A FASE 1 é uma fase de descobertas, na qual foram discutidos todos os conceitos hoje estabelecidos. Nessa FASE os conceitos podem se misturar e as referências são muitas vezes dúbias.
Na figura abaixo, eu ressaltei em VERMELHO o histórico de M. americana, desde sua descoberta por Marcgrave até o binômio de Müller (Sorex americanus), válido. Em AZUL CLARO, temos M. brevicaudata, da sua descoberta por Seba, até o primeiro binômio válido de Erxleben (Didelphis breuicaudata). Também procuro traçar um paralelo com a evolução do Systema Naturae, de Linnaeus (as edições).
Quando cunhou o termo MAMMALIA, em 1758, como animais vivíparos, Lineu desconhecia o Ornithorhynchus que só foi descrito em 1799. O gênero Ornithorhynchus pertence a um grupo de animais que se destacou bem na base da linha evolutiva dos mamíferos atuais, retendo muitos caracteres reptilianos. Esses animais não possuem útero, nem placenta, não são vivíparos, se reproduzindo através de ovos, como os répteis. A descoberta do ornitorrinco, teve como resultado uma grande reflexão sobre a evolução dos mamíferos, e consequentemente sobre A NOSSA PRÓPIA EVOLUÇÃO. O Ornithorhynchus anatinus, conhecido em inglês como platypus, foi descrito originalmente como Platypus anatinus por Shaw, em 1799. Mas como já existia um besouro com esse nome, em 1800, Blumenbach propoz o gênero Ornithorhynchus.
A história da investigação sobre o ornitorrinco revela muito sobre os processos da ciência. Rivalidades, competição e colaboração ocorreram entre grupos e entre países. Concepções e entendimentos prévios foram desafiados, e alguns estudiosos demoraram a aceitar as novas evidências contraditórias. Em 1799, termina a Revolução Francesa, que marcou o início de uma Nova Era para toda a humanidade, a Idade Contemporânea, e também para todas as ciências, portanto, para a BIOLOGIA, que deixou de ser apenas uma lista de nomes de seres vivos. O conceito atual de Biologia, como o estudo da vida, foi criado em 1802, e Jean-Baptiste Lamarck foi um dos primeiros cientistas a utilizá-lo.
Illiger,
J. K. W. 1815. Ueberblick der Säugethiere nach ihrer Vertheilung über
die Welheile. Abhandlungen der physikalischen Klasse der
Königlich-Preussischen Akademie der Wissenschaften, 1804–1811, 39–159. LINK
Shaw, George. 1800. General zoology or systematic natural history. London: G. Kearsley, 1:xv+1–552, 121 pls.
Na verdade Buffon não descreveu Le Touan em 1789, uma vez que já estava morto. Essa é a data de publicação da descrição de Le Touan, que está em sua História Natural (Histoire Naturelle) em 44 volumes, publicada entre 1749 e 1789, portanto uma publicação parcialmente póstuma. A descrição de Le Touan está na página 252 na Histoire naturelle générale et particuliére, servant de suite à l’histoire des animaux quadrupèdes. In Histoire naturelle, avec la description du cabinet du Roi, ed. G. L. L. de Buffon. Paris: L’Imprimerie Royale, Supplément, 7:1–8, ix–xx,+364 pp., 81 pls. Veja abaixo o Frontispício do volume, a descrição original e a ilustração de Jacques de Sève, PL.61, p.252, citada na descrição.
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O TOUAN.
Nós fornecemos aqui (prancha 61) a figura de um pequeno animal que nos foi enviado de Caiena pelo Senhor de la Borde, sob o nome de touan, o qual nós só podemos relacionar à espécie do gênero da doninha. Da pouca informação que o Senhor de la Borde nos deixou desse animal, ele disse apenas que era um adulto, que fica em troncos de árvores, e que se alimenta de vermes e insetos. A fêmea produz dois filhotes que ela carrega nas costas.
Este touan adulto tem apenas cinco polegadas e nove linhas de comprimento, da ponta do focinho até a origem da cauda; é menor que a doninha européia que geralmente tem seis polegadas e seis linhas, mas se assemelha no formato da cabeça e do corpo alongado sobre pernas pequenas, e difere nas cores dos pelos; a cabeça tem apenas uma polegada de comprimento; a cauda tem duas polegadas e três linhas, por sua vez a cauda da nossa doninha européia, tem apenas quinze linhas, e não é como a do touan, grande e grossa na base e muito fina na ponta. O touan tem cinco dedos armados de unhas em cada pé, na parte superior do focinho, na cabeça e no corpo até a cauda, é coberta por pelos negros; os lados do corpo são de um vermelho brilhante, a parte inferior do pescoço e o corpo todo de um branco bonito, os lados da cabeça e a parte de baixo das quatro pernas, são menos vivos do que os flancos. A cauda é coberta desde a sua origem até um terço de seu comprimento, de um pelo semelhante ao que cobre os membros e no resto do comprimento, é sem pelos; o interior das pernas é branco como a parte inferior do corpo: todo o pelo deste pequeno animal é macio ao toque.
Em 1800, o Touan de Buffon foi descrito por Bechstein (p.359). como uma doninha: Mustela touan, baseado em Buffon (1789: 252).
233. Das Tuan-Wiesel. (Tuan W.) p)
Le Touan de la Cepedes etc. Buffon Suppl. VI. (VII) 252 Tab. 61.
Der Obertheil des kopfs und Leibes ist schwärzlich; die Seiten des Leibes, Kopfs und der Beine glänzend rostfarben; der Untertheil des Halses und Leibes rein weiss; die Länge von der Nase bis zum Schwanze mehr als fünf Zoll; der Schwanz etwas mehr als zwen Zoll lang und nach dem Ende zugespizt.
Bewohnt Cayenne, lebt in hohlen Bäumen, nährt sich von Würmern und Insecten und bringt zwen Junge aus einmal zur Welt, melch es mit sich aus dem Rüken megträgt.
p) Mustela Touan. B.
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233. A doninha Tuan. (d. Tuan) p)
Le Touan de la Cepedes etc. Buffon Supl. VI. (VII) 252 Tab. 61.
A parte superior da cabeça e do corpo é enegrecida; os lados do corpo, cabeça e pernas cor de ferrugem brilhante; a parte inferior do pescoço e do corpo são de um branco puro. O comprimento do nariz até a cauda mais de cinco polegadas; a cauda com pouco mais de dois centímetros de comprimento e com ponta fina.
Habita Caiena, vive em árvores ocas, se alimenta de vermes e insetos e dá à luz duas crias de tempos em tempos, ordenhando-as nas costas.
p) Mustela Touan. B.
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George Shaw, 1800. General Zoology, p.432, também baseado em Buffon (1789: 252), descreveu Viverra touan.
TOUAN.
Viverra Touan. V. ferruginea, subtus alba, cauda versus apicem nuda.
Ferruginous W. white beneath, with the tail naked towards the tip.
Le Touan. Buff. suppl.7. p.252. pl.61.
Esta espécie muito pequena, menor que a doninha comum, que é nativa de Caiena, vive em buracos de árvores, e se alimenta de vermes e insetos. A parte superior do focinho, a cabeça, e todo o corpo até a cauda, é enegrecida; os lados do corpo e membros são de um ferrugem vivo; e as partes inferiores, da garganta à cauda, branco: a cauda é nua em direção à ponta.
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ICONOGRAFIA DE LE TOUAN DE BUFFON (Monodelphis brevicaudata touan), o fenótipo TOUAN.
Talvez pela sua vistosa pelagem, le Touan de Buffon foi mais frequentemente figurada que as demais espécies do gênero. Além da gravura em branco e preto, de J. de Sève (usada na descrição original), outras figuras coloridas aparecem nas diversas edições das obras de Buffon.
Dois pontos da descrição do Touan de Buffon chamaram minha atenção: "mas se assemelha (à doninha) no formato da cabeça e do corpo alongado sobre pernas pequenas," e "O touan tem cinco dedos armados de unhas em cada pé". Certamente essas afirmações não correspondem as características dessa espécie, e provavelmente exista uma justificativa para isso. Se levarmos em consideração as 4 primeiras ilustrações, podemos notar uma mudança na forma de se representar a cabeça desse animal. Nas três primeiras, o focinho do animal é curto, realmente lembrando o focinho de uma doninha, mas na quarta o Touan é apresentado com um focinho pontudo, como nos didelfídeos. Acredito que Buffon, quando realizou a descrição, tenha se baseado num animal empalhado (o que explicaria a sua pequena plataforma basal), ou até numa pele sem o crânio ou o esqueleto. Isso certamente fez com que ele considerasse o animal como uma doninha.
As figuras abaixo não são de Buffon. A da esquerda é de Cuvier 1827, Animal Kingdom, e a da direita é de Schreber 1872, Die Säugethiere. Ambas certamente foram baseadas em animais empalhados, uma prática comum na época, isso é bem evidente. A figura de Cuvier representa o Touan com um focinho pontudo, uma marca dos didelfídeos. No entanto as orelhas, os olhos e os dentes são de uma múmia empalhada. A figura de Schreber se assemelha muito à de Buffom, igualmente representada sobre uma pequena plataforma, como outras figuras dessa mesma obra. Nessa época as gravuras eram impressas em série, mas pintadas a mão, uma a uma. Verdadeiras jóias da coroa.
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Na FASE 1, que vai de 1648 até 1800, o conceito de Monodelphis ainda não existia, e nem o conceito de Didelphis ou de Marsupial tinham o significado que têm hoje. Nessa fase todos os marsupiais eram Didelphis, até cangurus e inclusive um primata, Didelphis macrotarsus (hoje Tarsius tarsier).
Em 1735, na 1ª edição do Systema Naturae, Lineu colocou Didelphis na Ordo Ferae, juntamente com alguns dos atuais Carnivora, "insetívoros" e o morcego Vespertilio. Posteriormente, na 6ª edição, na Ordo Glires, juntamente com roedores e "insetívoros", e em 1758, na 10ª edição, a mais importante, Didelphis foi colocado na Ordo Bestiae, que incluía "insetívoros", os tatus: Dasypus e os porcos.
Entre 1788 e 1793, Johann Friedrich Gmelin publicou uma versão aprimorada do Systema Naturae de Lineu, que é considerada como a 13ª edição do Systema. Nessa edição Didelphis foi recolocado na Ordo Ferae.
Mathurin Jacques Brisson, em 1756, foi o primeiro a separar os marsupiais dos ratos e "insetívoros" descritos por Albertus Seba, no seu Thesaurus. Ele criou a ORDO XVIII com um único gênero: Philander, que era composto por 9 espécies. Sendo o primeiro a separar o Philander cauda brevi, dos demais congêneres, o qual seria mais tarde, nominado por Erxleben como Didelphis brevicaudata, em 1777. Só em 1788, Gmelin inseriu Didelphis brachyura (de Schreber) como a espécie 8, de Didelphis, no Systema Naturae, citando Brisson.
Em 1758, na DÉCIMA EDIÇÃO, Linnaeus reconheceu apenas 5 espécies no seu gênero Didelphis: 1. D. marsupialis, 2. D. philander, 3. D. opossum, 4. D. murina e 5. D. dorsigera. A partir dessas 5, o gênero Didelphis de Linnaeus, passou a aglutinar todos os marsupiais conhecidos, até os cangurus. Em 1792, no Animal Kingdon de Robert Kerr, uma versão do Systema Naturae de Gmelin, o gênero contava com 19 espécies, e continuava incluído na Ordo Ferae.
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Em 1803, Geoffroy Saint-Hilaire coloca o gênero Didelphis (de Linnaeus) numa ordem separada, PÉDIMANES, que incluía outros gêneros de marsupiais, antes colocados dentro de Didelphis. Genre XL Dasyurus, e Genre XLI Phalangista. Mas os cangurus foram colocados junto com os roedores na Ordem VI RONGEURS. Nessa mesma publicação, na página 144, Geoffroy criou Didelphis tricolor, um novo nome para D. brachyura de Pallas, que ele considerou como uma espécie diferente de D. brachyura de Schreber. Ele também reconheceu o TOUAN de Buffon como um sinônimo de Didelphis tricolor, transferindo a espécie de Buffon do gênero das doninhas, para o gênero Didelphis.
Em 1811, Illiger cria o táxon Marsupialia, como uma familia da Ordo Pollicata, que incluía os Primatas. Essa familia era constituida pelos gêneros Didelphis, Chironectes, Thylacis, Dasyurus, Amblotis, Balantia, Phalangista e Phascolomys. Mas, assim como Geoffroy, manteve os cangurus num grupo separado: na Ordo Salientia.
Em 1815, assim como Geoffroy (1803:144), Illiger associou o "Tuan" (de Buffon), com Didelphis brachyura (de Pallas), e afirmou que : "a brasileira [Didelphis] Tristriata é uma espécie interessante, porque foi colocada com os musaranhos sob o nome Sorex Brasiliensis (de Erxleben, =americanus de Müller), após um comunicado inadequado do normalmente estimado Marcgrave. Mas tem todas as características de um verdadeiro marsupial". Esse "reconhecimento" foi, sem dúvida, uma postura decisiva na História Taxonômica do gênero Monodelphis.
Finalmente, só em outubro de 1816, no prefácio de O Reino Animal, George Cuvier coloca "todos" os marsupiais dentro da ORDRE Marsupiaux. Desta vez incluindo também os cangurus. Mas não aceitou Didelphis tricolor de Geoffroy, tratando Le Touan como (Did. brachyura), v. a fig. abaixo. Também não mencionou Didelphis tristriata de Illiger, nem sequer entre os musaranhos como: Sorex brasiliensis.
Veja que na página 174, seguindo Geoffroy Saint-Hilaire, 1803:144, Cuvier inclui o Touan de Buffon entre os Marsupiais, no gênero Didelphis. |
Os animais que hoje são colocados no gênero Monodelphis, foram inicialmente chamados de ratos, popularmente ainda são tratados assim, a espécie Monodelphis domestica é chamada de rata catita ou de rato-cachorro. O termo MUS ou MURIS era aplicado aos pequemos mamíferos, indiscriminadamente. A espécie de Monodelphis hoje conhecida como Monodelphis americana, permaneceu durante 167 anos como "O Musaranho do Brasil" e a atual Monodelphis brevicaudata, foi rato, musaranho, doninha e viverrídeo, além de Didelphis. A FASE 1 é uma fase de descobertas, na qual foram discutidos todos os conceitos hoje estabelecidos. Nessa FASE os conceitos podem se misturar e as referências são muitas vezes dúbias.
Na figura abaixo, eu ressaltei em VERMELHO o histórico de M. americana, desde sua descoberta por Marcgrave até o binômio de Müller (Sorex americanus), válido. Em AZUL CLARO, temos M. brevicaudata, da sua descoberta por Seba, até o primeiro binômio válido de Erxleben (Didelphis breuicaudata). Também procuro traçar um paralelo com a evolução do Systema Naturae, de Linnaeus (as edições).
Quando cunhou o termo MAMMALIA, em 1758, como animais vivíparos, Lineu desconhecia o Ornithorhynchus que só foi descrito em 1799. O gênero Ornithorhynchus pertence a um grupo de animais que se destacou bem na base da linha evolutiva dos mamíferos atuais, retendo muitos caracteres reptilianos. Esses animais não possuem útero, nem placenta, não são vivíparos, se reproduzindo através de ovos, como os répteis. A descoberta do ornitorrinco, teve como resultado uma grande reflexão sobre a evolução dos mamíferos, e consequentemente sobre A NOSSA PRÓPIA EVOLUÇÃO. O Ornithorhynchus anatinus, conhecido em inglês como platypus, foi descrito originalmente como Platypus anatinus por Shaw, em 1799. Mas como já existia um besouro com esse nome, em 1800, Blumenbach propoz o gênero Ornithorhynchus.
A história da investigação sobre o ornitorrinco revela muito sobre os processos da ciência. Rivalidades, competição e colaboração ocorreram entre grupos e entre países. Concepções e entendimentos prévios foram desafiados, e alguns estudiosos demoraram a aceitar as novas evidências contraditórias. Em 1799, termina a Revolução Francesa, que marcou o início de uma Nova Era para toda a humanidade, a Idade Contemporânea, e também para todas as ciências, portanto, para a BIOLOGIA, que deixou de ser apenas uma lista de nomes de seres vivos. O conceito atual de Biologia, como o estudo da vida, foi criado em 1802, e Jean-Baptiste Lamarck foi um dos primeiros cientistas a utilizá-lo.
A Coroação de Napoleão - de Jacques-Louis David. (Museu do Louvre) |
Essa obra retrata o momento da coroação de Napoleão I como Imperador da França na Catedral de Notre-Dame, em 2 de dezembro de 1804. A pintura possui 10 metros de largura e 6 metros de altura. De acordo com os rituais de coroação, o imperador ajoelhava-se frente ao representante da Igreja, que colocava em sua cabeça a coroa, demonstrando assim a superioridade do poder religioso sobre o poder temporal dos homens. Napoleão Bonaparte alterou o ritual, tomando a coroa em suas próprias mãos, se auto coroando, deixando o papa Pio VII como um mero espectador. Em 1809, Jean-Baptiste Lamarck, um naturalista francês, publicou o seu livro "Filosofia Zoológica" (a primeira Teoria Sintética da Evolução). Essa obra é um marco inicial da ruptura, entre a Igreja e o Estado, que veio junto com a Revolução Francesa.
Literatura citada
Literatura citada
Bechstein, Johann Matthäus. 1800. Thomas Pennant’s Allgemeine uebersicht der vierfüssigen thiere. Aus dem Englischen ü bersetzt und mit anmerkungen und zusätzen versehen, von Johann Matthäus Bechstein. Weimar: Im verlage des Industrie-Comptoir’s, 2:x+2, 323–666, pls. 35–54.
Buffon, Georges-Louis le Clerc. comte de, 1789. Histoire naturelle générale et particuliére, servant de suite à l’histoire des animaux quadrupèdes. In Histoire naturelle, avec la description du cabinet du Roi, ed. G. L. L. de Buffon. Paris: L’Imprimerie Royale, Supplément, 7:1–8, ix–xx,+364 pp., 81 pls.
Cuvier, G. 1817. Le règne animal distribué d’après son organisation, pour servir de base à l’histoire naturelle des animaux et d’introduction à l’anatomie comparée. Paris: Deterville, 1:xxxviii+540 pp. LINK
Erxleben, Johann Christian Polycarp. 1777. Systema regni animalis per classes, ordines, genera, species, varietates cum synonymia et historia animalium. Classis I, Mammalia. Lipsiae: Impensis Weygandianis, xlviii+636 pp.+64.
Geoffroy St.-Hilaire, E. 1803. Catalogue des mammifères du Muséum National d’Histoire Naturelle. Paris, 272 pp.
Griffith, E., C. Hamilton-Smith, and E. Pidgeon. 1827. The class Mammalia arranged by the Baron Cuvier, with specific descriptions. In The Animal Kingdom arranged in conformity with its organization, by the Baron Cuvier, . . . with additional descriptions of all the species hitherto named, and of many not before noticed, by Edward Griffith . . . and others. London: Geo. B. Whittaker, 3:1–468. LINK
Illiger, J. K. W. 1811. Prodromus systematis mammalium et avium additis
terminis zoographicis utriusque classis, eorumque versione germanica.
Sumptibus C. Salfeld, Berolini [Berlin]: [I]-XVIII, [1]-301, Errata et
Omissa. LINK
Lamarck, Jean-Baptiste Pierre Antoine de Monet, Chevalier de. 1802. Hydrogéologie, ou, Recherches sur l'influence qu'ont les eaux sur la surface du globe terrestre sur les causes de l'existence du bassin des mers, de son déplacement et de son transport successif sur les différens points de la surface de ce globe; enfin sur les changemens que les corps vivans exercent sur la nature et l'état de cette surface. L'auteur au Muséum d'histoire naturelle, Paris. 1802. 268 pp.
Lamarck, Jean-Baptiste Pierre Antoine de Monet, Chevalier de. 1809. Philosophie zoologique, ou exposition des considerations relatives à l’histoire naturelle des animaux; à la diversité de leur organisation et des facultés qu’ils en obtiennent; aux causes physiques qui maintiennent en eux la vie et donnent lieu aux mouvements qu’ils exécutent; enfin à celles que produisent , les unes le sentiment et les autres l’ intelligence de ceux qui en sont doués. 2 vols. Paris: chez Dentu/L’Auteur, LINK
Linnaeus, Carolus (1758). Systema naturae per regna tria naturae : secundum classes, ordines, genera, species, cum characteribus, differentiis, synonymis, locis. LINK
Pallas, Peter Simon. 1784. Didelphis brachyvra, descripta. - Acta Academiae Scientiarum Imperialis Petropolitanae 1780 (2): 235-247, Tab. V.
Schreber, J. C. D. von. 1777. Die Säugthiere in Abbildungen nach der
Natur mit Beschreibungen. Erlangen: Wolfgang Walther, 3:377–440, pls.
1776–78.
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